Análise

Eleições 2020: O que as disputas do segundo turno podem dizer sobre 2022

Eleitores de 57 cidades voltam às urnas para o segundo turno, sendo 18 capitais, onde, em pelo menos cinco, a disputas ajudam a desenhar o cenário nacional

Por Franco Malheiro
Publicado em 28 de novembro de 2020 | 08:00
 
 
 
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Em 57 cidades do país, 38 milhões de eleitores escolhem neste domingo (29) os prefeitos que vão governar os municípios pelos próximos quatro anos. As mineiras Contagem, Juiz de Fora, Uberaba e Governador Valadares estão na lista e cerca de 1,2 milhão de eleitores voltam às urnas. 

Desse total de cidades brasileiras, 18 são capitais, e em pelo menos cinco delas (São Paulo, Rio de Janeiro, Recife, Fortaleza e Porto Alegre) as disputas merecem maior atenção. Os cenários nesses locais não apenas trazem um clima polarizado e acirrado, mas também apontam tendências para as próximas eleições, em 2022.

Começando por São Paulo, a disputa na maior metrópole do Brasil chama atenção não apenas por se tratar do principal centro econômico do país, mas também por desenhar um cenário com efeito direto no próximo pleito presidencial. 

De um lado, o atual prefeito Bruno Covas (PSDB) lidera as pesquisas e sua vitória manteria o poder nas mãos do grupo político ligado ao atual governador de São Paulo, João Doria (PSDB), apontado como um dos principais nomes a polarizar a disputa contra Bolsonaro em 2022. 

Do outro lado, Guilherme Boulos (PSOL) demonstra crescimento em todas as pesquisas e tem chances, mesmo com a derrota eleitoral, de sair do pleito como um nome forte a disputar as eleições de 2022 pelo campo da esquerda. 

“O Boulos deve perder a eleição em São Paulo, seria uma surpresa se ele conseguisse reverter essa diferença para o Covas agora no fim, mas, por outro lado, ele surge forte para 2022 e será mais uma dor de cabeça para o PT, que saiu enfraquecido das eleições. Eu diria que o Boulos é o nome, mesmo perdendo, que sai mais fortalecido das eleições, até mais do que o Doria em uma vitória de Covas”, analisou Adriano Cerqueira, professor de ciência política do Ibmec e da Universidade Federal de Ouro Preto. 

O professor, no entanto, pondera que, mesmo com a vitória de Covas, João Doria pode ainda sair enfraquecido desse processo.

“Esse cenário em São Paulo, em que Covas não ganha com tanta facilidade, aponta também para um desgaste na popularidade de Doria e do PSDB paulista”, pontuou.

Já no Rio de Janeiro, a disputa caminha para um desfecho mais certo. As pesquisas apontam vitória por mais de 70% do ex-prefeito Eduardo Paes (DEM) contra o atual prefeito, Marcelo Crivella (Republicanos). A desmobilização do eleitor, o enfraquecimento da esquerda, a má avaliação do mandato de Crivella e o isolamento do bolsonarismo são fatores que explicam a dianteira de Paes. 

“O Crivella teve uma administração complicada, um mandato marcado por diversos problemas administrativos que culminou na pandemia, gerando uma grande desmobilização, com 52% de não votos no primeiro turno. Desse processo todo, a esquerda carioca também sentiu o efeito disso, pois acabou perdendo muitos votos para a abstenção”, afirmou.

“Nem PT e nem PDT conseguiram emplacar suas candidatas para o segundo turno e saíram enfraquecidosno Rio. Para esse eleitorado, que é anti-Crivella sobrou o Paes, que, embora não seja muito palatável para o campo progressista da cidade, sua vitória representaria também a derrota do bolsonarismo no Rio. É muito difícil que o Crivella consiga reverter”, detalhou Cerqueira.

Porto Alegre: Manuela perde para a rejeição à equerda

Nesse cenário de rejeição alta às esquerdas, a candidatura - entre as que estão postas no segundo turno - que mais sentiu esse impacto foi a de Manuela D'ávila (PCdoB) em Porto Alegre. A gaúcha, que começou o primeiro turno liderando a maioria das pesquisas, foi para o segundo já atrás de Sebastião Melo (MDB). Mesmo em uma disputa teoricamente apertada, 49% a 42%, Cerqueira avalia que dificilmente a comunista reverta o resultado.

“Não é nem antipetismo, é anti-comunismo mesmo. Então com certeza ela perdeu essa eleição para essa essa rejeição à esquerda que é muito forte no Sul. Desde o começo eu achava difícil para ela ganhar, até imaginava que ela pudesse chegar no segundo turno como chegou, mas dificilmente a enxergava superando o voto bolsonarista”, concluiu. 

Recife: Disputa ‘familiar’ embolada

Em Recife, a disputa acontece entre os primos Marília Arraes (PT) e João Campos (PSB). As últimas pesquisas apontam um cenário de empate técnico entre a petista e o socialista, e o clima na capital pernambucana talvez seja o mais polarizado e com maior número de ataques de ambos os lados. 

“Um eleitorado majoritariamente mais à esquerda, que está muito dividido. Em Recife, talvez seja o cenário mais incerto das capitais. Quando se chega a uma situação de só 3% entre um candidato e outro, que é empate técnico, qualquer palpite é mera suposição”, destaca Adriano Cerqueira. 

No entanto, Cerqueira aponta para uma tendência de virada na capital de Pernambuco. João Campos, segundo as últimas pesquisas, aparece em crescimento enquanto sua adversária demonstra queda.

“A Marília começou o segundo turno na frente, e ao longo da campanha a diferença entre ela e o João vem diminuindo. Isso é indicativo que o eleitorado esteja migrando para a candidatura do João”, explicou Cerqueira.

Fortaleza: União contra o bolsonarismo

Em Fortaleza, a disputa ficou entre José Sarto (PDT) e Coronel Wagner (PROS). O pedetista, ligado à família Gomes, lidera a corrida, conforme apontam as pesquisas, com 53% contra 35% de Coronel Wagner, candidato alinhado ao presidente Jair Bolsonaro. 

Na capital cearense, a costura para o segundo turno se deu de maneira um pouco parecida com a desenhada no Rio de Janeiro, porém mais explícita. 

Com aparições na propaganda eleitoral do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), do tucano Tasso Jereissati (PSDB), do governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), e do governador do Ceará, Camilo Santana (PT), Sarto angariou apoio de todos os campos políticos, isolando o candidato bolsonarista. Com esse cenário e considerando o resultado das pesquisas, a disputa de lá tende para uma vitória do candidato do PDT.

Para Adriano Cerqueira, porém, ainda é cedo para afirmar que essa frente pluripartidária contra um candidato bolsonarista seja indicativo de que haverá uma frente ampla em 2022.

“Essa formação no Ceará está em um contexto regional e histórico. Agora não sei em que ponto essa frente seja expandida para o contexto nacional.Não que ela não vá acontecer, mas para um primeiro turno eu ainda acho difícil que se tenha essa frente em torno de um único candidato, até porque, hoje, não existe esse nome que consiga abarcar todos esses campos em uma eleição geral”, ponderou Cerqueira.

Bolsonarismo sai enfraquecido?

Mesmo Bolsonaro sendo apontando como um cabo eleitora inábil, uma vez que a maioria de seus candidatos naufragaram nas eleições municipais,  Adriano Cerqueira avalia o processo, de uma maneira geral, prositvo para o presidente.  

“Vimos partidos pequenos de centro direita crescendo e os grandes partidos perdendo força, como PT, MDB e PSDB. O enfraquecimento do PT e a centro direita também não consigo construir um nome competivo pensando em 2022 nas municipais, dá um suspiro maior ao Bolsonaro", avalia o professor. 

Para Cerqueira, do ponto de vista da articulação política, o presidente pode ter conquistado nessas eleições novos aliados.  

"A vitória desses partidos pequenos pode representar para o Bolsonaro uma outra frente ampla de partido que ele pode, tanto costurar apoio no congresso, como também preparar chapas para as eleições gerais sem ter que depender tanto das grandes legendas”, analisa Cerqueira.

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