O TEMPO DADOS

Número de vereadores atinge limite máximo em 88% das Câmaras de Minas Gerais

Só 106 dos 853 municípios abrem mão do teto de vagas permitido pela legislação

Por Cristiano Martins
Publicado em 24 de setembro de 2020 | 07:30
 
 
 
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Em tempos de crise econômica e sob forte pressão popular, a Câmara Municipal de Itajubá, no Sul de Minas, retrocedeu e abriu mão do máximo de cadeiras permitido pela lei. Após ter ampliado o número de dez para 17 na legislatura passada, a Casa ouviu o clamor da sociedade e decidiu ter 11 vereadores a partir do ano que vem.

Esta, no entanto, é uma situação rara em Minas Gerais. Um levantamento inédito de O TEMPO revela que apenas 106 das 853 Câmaras Municipais do Estado – isto é, somente 12% – não atingem o teto autorizado pela Constituição com base na quantidade de moradores. Os dados são da Justiça Eleitoral e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

A oferta de cargos chega a extrapolar o limite em três cidades mineiras, se considerados os cálculos do IBGE. As Câmaras de Montalvânia (Norte), Água Boa e Bom Jesus do Galho (Rio Doce) possuem 11 vagas de vereador em disputa, mas deveriam ter no máximo nove representantes, segundo as estimativas oficiais do instituto.

Nestas eleições de 2020, oito cidades terão mudanças. Além de Itajubá, houve reduções também em Arcos (Oeste), Luz (Central) e Itaú de Minas (Sul). Por outro lado, as vagas aumentaram em Mateus Leme (Metropolitana), Rio Pardo de Minas (Norte), Itapagipe e Uberaba (Triângulo).

Ao todo, os eleitores mineiros escolherão 8.480 legisladores em nível municipal para o novo mandato. Esse número chegou a ser 8% menor em 2004, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) fixaram a quantidade de vereadores em todas as cidades do Brasil. O objetivo era estabelecer uma proporção entre cadeiras e habitantes, reduzindo assim os “abusos resultantes da redação anterior”.

A oferta de cargos, no entanto, voltou a crescer a partir de 2012, após a aprovação de uma Emenda Constitucional pelo Congresso. O texto deu mais autonomia às Câmaras Municipais ao definir apenas um limite máximo dentro de cada faixa populacional.

 


Uberaba alega necessidade após crescimento

O maior aumento para o próximo mandato acontecerá em Uberaba, no Triângulo Mineiro. Apesar de reações negativas da população, os 14 vereadores da atual legislatura aprovaram ainda em 2017 um incremento de sete novas vagas a partir do ano que vem. Mesmo assim, o município continuará abaixo do máximo permitido pela lei, pois poderia ter até 23 representantes na Câmara.

O projeto de ampliação foi apresentado em novembro daquele ano e aprovado em definitivo apenas 22 dias depois, sem audiências públicas, gerando manifestações contrárias na cidade. O crescimento da população foi o principal argumento defendido pelos legisladores para justificar a decisão.

“É um caso diferente de outras cidades. Até pouco tempo atrás tínhamos 19 vereadores, e houve uma redução para 14. Depois disso, Uberaba entrou numa fase de crescimento demográfico muito grande e sentiu a necessidade de ter uma maior representatividade”, afirma o presidente da Câmara, Ismar Vicente dos Santos (PSD).

Sobre as reações, ele acredita que o atrito está solucionado. “Houve alguma discussão porque parte da população não entendeu que o duodécimo (repasse financeiro da Prefeitura) permanece o mesmo. Será feita uma readequação administrativa. Não trará aumento para os cofres públicos”, garante Santos.

Na época da aprovação, os vereadores haviam sinalizado a apresentação de outros projetos visando à diminuição dos gastos, o que não aconteceu. Ao contrário, em março de 2018, o plenário aprovou um reajuste de 2% nos salários, de R$ 12.200 para R$ 12.451.

“Conseguimos economizar e devolver R$ 1,3 milhão ao Executivo no ano passado, e mais R$ 500 mil até agora neste ano. Isso traz tranquilidade à população. Não foi tratado na matéria (o corte de custos), mas com certeza terá que ser reduzido dentro do orçamento. É lógico que vamos reduzir algumas situações”, conclui o presidente, citando como exemplo uma possível supressão no número de assessores nos gabinetes.

 


Pressão popular leva a redução em Itajubá

Passadas três legislaturas com dez cadeiras após a redução imposta pela Justiça Eleitoral, os vereadores do ciclo 2013-2016 aproveitaram a flexibilização da regra e aumentaram para 17 os cargos na Câmara de Itajubá, no Sul de Minas. A decisão gerou revolta, e a reação popular compeliu os novos eleitos a tentarem recuperar a imagem da Casa.

Com apenas um voto contrário, o plenário decidiu em 2018 reduzir a oferta novamente, desta vez para 11 cadeiras a partir do ano que vem. De acordo com o vereador Cleber David (PSD), a pressão popular foi o principal fator levado em conta para a mudança.

"Houve uma movimentação muito forte em torno disso. O pessoal foi intransigente (vereadores da legislatura anterior), e muitos acabaram não se reelegendo, pela imagem desgastada em função do aumento e de não terem aceitado a opinião pública, que era contrária. Na atual gestão, todo mundo percebeu que esse número não era aceito pela comunidade, por isso chegou-se a um consenso", conta.

Em nota, a Câmara de Itajubá informou que a redução das cadeiras representará uma economia de aproximadamente R$ 4 milhões para os cofres públicos durante a próxima legislatura. Segundo a assessoria da Casa, uma pesquisa de opinião realizada em 2015 havia apontado que 95% da população eram contrários ao número de 17 vereadores, e 91% discordavam de qualquer aumento nas vagas.

"Acho que a previsão é muito boa, uma redução aritimética e significativa no número de assessores, viagens, veículos e gastos indiretos em geral", aprova o vereador.

 

Votação na Câmara foi acompanhada por representantes da sociedade
(Foto: Reprodução/CMI)

 

Corte de custos 'cria' menor Câmara de Minas

Outro caso que chama atenção é o de Itaú de Minas, na região Sul do Estado. Com mais de 16 mil habitantes, o município poderia ter até 11 representantes. Os nove vereadores da atual legislatura, porém, reduziram ainda mais a oferta de cadeiras, para apenas sete a partir do ano que vem.

Desta forma, a cidade se isolará como detentora da menor Câmara do Estado. Enquanto isso, nenhum dos 598 municípios mineiros com até 15 mil habitantes abriu mão da cota máxima de nove vereadores.

O principal motivo para a diminuição das vagas em Itaú de Minas foi a necessidade de cortar gastos. De acordo com a assessoria da Câmara, serão economizados R$ 376 mil apenas em salários nos próximos quatro anos, além dos custos dos gabinetes e das despesas indiretas.

Pela mesma razão, a atual legislatura decidiu também reduzir os vencimentos dos vereadores, de R$ 3.900 para um salário mínimo (atualmente R$ 1.045) – por questões legais, o novo valor só poderá ser praticado a partir de 2025.

 

 

Câmaras não responderam contatos da reportagem

A reportagem de O TEMPO procurou as Câmaras Municipais de Água Boa, Bom Jesus do Galho e Montalvânia insistentemente, por telefone e por e-mail, desde o último dia 22 de setembro, para pedir esclarecimentos sobre o número de vereadores além do máximo permitido pela lei de acordo com as estimativas populacionais oficiais do IBGE.

Por telefone, funcionários da Câmara de Montalvânia disseram que encaminhariam a demanda aos responsáveis e retornariam os contatos para apresentar as respostas, mas não o fizeram até o momento desta publicação. Já as Câmaras de Água Boa e Bom Jesus do Galho não atenderam as ligações nem responderam as mensagens.

 

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