Representatividade

Quais espaços te cabem?

Quais locais, cargos, grupos de amizade e núcleos familiares te acolheriam assim, do jeitinho que você é?

Por Tatiana Lagôa
Publicado em 13 de outubro de 2023 | 03:35
 
 
 
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Quais espaços te cabem? Essa pergunta, que parece ser extremamente simples se avaliada pelo ponto de vista meramente lógico, é, na verdade, bastante profunda. Uma criança responderia que ela não consegue entrar em um balde pequeno, mas que pode nadar na bacia da casa da avó, por exemplo. Porém, como nosso papo é para adultos, eu quero que você pense nisso pela óptica do pertencimento. Quais locais, cargos, grupos de amizade e núcleos familiares te acolheriam assim, do jeitinho que você é?

Eu sei que a resposta padrão é: “Eu pertenço ao espaço que eu desejar estar”. Tudo bem, essa é a versão desejada. O mundo ideal. Agora, vamos tirar a cortina social e entreolhar pelas “gretas” para mostrar o que é o mundo real. Eu também luto para que todos nós possamos estar em todos os locais, mas, enquanto estiver no âmbito da “luta”, é porque o problema ainda existe. O pertencimento pleno só é real quando não precisa ser solicitado. 

Dito isso, eu posso começar, para facilitar o seu processo. Como mulher negra, eu não sou vista como pertencente em todos os contextos. Muito longe disso, aliás. Já recebi olhares constrangedores em restaurantes, ouvi que não deveria estar em camarote onde estava como mais uma entre os demais convidados, não fui atendida em lojas, entre outras situações desagradáveis. 

Mas esse não pertencimento nem é o pior tipo deles. O pior mesmo é quando ele tira oportunidades. Quantas pessoas negras não conseguem alcançar cargos de liderança, por exemplo, em função de racismo? É uma estatística que nunca vai ser exata, porque ela pode vir escondida em desculpas como o velho “não tinha perfil para a vaga”. Normalmente, as mesmas vagas que em um passado muito recente pediam “boa aparência”, um requisito extremamente subjetivo que, em um país racista, exclui pessoas pretas. 

Agora, vamos expandir um pouco mais. Como é a situação das mulheres? Até pouco tempo, nem votar nós podíamos. Até recentemente, nem banheiro feminino para parlamentares existia, porque política não era “coisa de mulher”. E como são machistas muitos dos frequentadores de estádios de futebol! Qual o público que de fato se sente confortável ao assistir a um jogo ao lado de determinadas torcidas organizadas?

Quais são os espaços de acolhimento para a população LGBTQIAPN+ em um país onde as pessoas ainda debatem se elas podem se casar? Gente, é como se estivessem legislando se o tipo de união é aceita pela sociedade ou não. E aqui eu preciso me estender um pouco mais, porque sei que o debate tem sido intenso. Vamos pensar juntos: duas pessoas se apaixonam e decidem dividir a vida. Cabe a quem a definição sobre o tipo de união que terão a partir daquele momento?

Opção um: a toda a sociedade, porque a religião, as crenças, o modo de vida de todos têm que ser iguais. Opção dois: se eu for gastar tempo analisando a vida de todo mundo, vou ficar exausto, então cada um que viva o amor como e com quem quiser. É simples desse jeito. Com tantos problemas no país, tanta coisa para ser proibida e legislada, por qual razão uma camada da população vai brigar tanto para impedir o casamento alheio? Aí a gente vem dizer que em todo espaço cabe todo mundo. Jura?

E quando usam razões religiosas para justificar exclusão é que a coisa fica sem sentido mesmo. Como é que eu vou usar um mecanismo que prega a união e a tolerância para justificar pensamentos intolerantes? Tudo certo, não precisa responder. Só pense sobre. 

Mas vamos lá. Falei tudo isso, com tanta interrogação, para fazer um convite para quem acompanha a coluna e acha o tema da diversidade algo relevante. Amanhã, dia 14, eu vou mediar uma das mesas do II Fórum de Diversidade e Inclusão nas Organizações, o “DiversiProsa – Pessoas diversas, espaços múltiplos: reescrevendo histórias de inclusão”.

Feito pela turma de formandos da pós-graduação de comunicação e diversidade nas empresas, da PUC Minas – curso que me orgulho em dizer que concluí –, o evento vai trazer respostas, mais perguntas e possíveis caminhos com excelentes especialistas de mercado e das universidades. Será a partir das 8h30, no Memorial Minas Vale, na praça da Liberdade, em BH. Partiu?

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