PAULO NAVARRO

O Mestre dos Labirintos

Entrevista com Felipe Mendes

Por Paulo Navarro
Publicado em 25 de março de 2024 | 03:00
 
 
 
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Da pequena Poço Fundo para o grande mundo. Eis a trajetória do nosso entrevistado, o neurocirurgião e gestor Felipe Mendes. Como todo excelente médico, muito estudo e muita dedicação, desde a faculdade para sempre. Medicina e tecnologia estão em permanente avanço, tratando e, sempre que possível, curando o que, muitas vezes e há pouco, não tinha tratamento, muito menos cura. E atentem para esta especialidade, dedicada aos problemas que afetam o sistema nervoso: cérebro, coluna vertebral e nervos. Que responsabilidade! O cérebro, por exemplo, é um motor, uma máquina perfeita, mas muito delicada e frágil. O mínimo problema pode afetar não só a qualidade de vida, mas a própria vida. E Felipe, além de trazer boas notícias sobre a neurocirurgia no Brasil, é a própria melhor notícia. Para completar a medicina, tem um MBA executivo em gestão de saúde pelo Hospital Albert Einstein e MBA de finanças. Por quê? Porque a gestão eficiente e colaborativa é capaz de transformar vidas. E é esta a vocação de Felipe: transformar, salvar vidas. Parabéns a ele e boa leitura a todos.

Felipe, um pouco de tua trajetória, por favor…
Sou nascido e criado no Sul de Minas, na pequena Poço Fundo. Sempre tive grande apoio dos meus pais, que se dedicaram muito para me proporcionar condições satisfatórias de estudos. Mudei para BH quando fui aprovado na faculdade de medicina da UFMG. Após a faculdade, fiz a residência de neurocirurgia no Hospital João XXIII e Felício Rocho, com a oportunidade de passar alguns períodos fora.

Onde, pode exemplo?
Conhecendo outros serviços de neurocirurgia nos Estados Unidos, no Canadá e na Rússia. Hoje, atuo em Belo Horizonte e em Sete Lagoas, com atendimentos no consultório e realizando cirurgias em hospitais parceiros. Além disso, coordeno o serviço de neurocirurgia do Hospital Municipal de Sete Lagoas e sou preceptor do programa de residência de neurocirurgia do Hospital das Clínicas.

Para os bem leigos, o que é a neurocirurgia?
É a especialidade da medicina dedicada aos problemas que afetam o sistema nervoso, formado pelo cérebro, coluna vertebral e nervos. O enfoque são os tratamentos cirúrgicos, mas existem muitas condições que podem ser manejadas sem necessidade de cirurgias.

Que doenças ou incapacidades são tratadas por ela?
Existem inúmeras condições, que vão desde malformações como a mielomeningocele (operadas, até mesmo, dentro do útero) até dores de coluna, hérnias de disco, tumores cerebrais, aneurismas cerebrais, hidrocefalia, traumatismos cranianos e da coluna, escoliose, síndrome do túnel do carpo, dentre outros.

O Brasil está “bem na foto”, quando o assunto é neurocirurgia?
O Brasil pode se orgulhar, pois conta com excelentes profissionais. A neurocirurgia brasileira é ativa em muitas sociedades médicas internacionais. Muitos neurocirurgiões que atuam no Brasil tiveram a oportunidade, assim como eu, de visitar e acompanhar outros colegas em outros países, como Estados Unidos, e também europeus. Contudo, existe uma distribuição irregular, com muitos profissionais concentrados em grandes centros.

Temos a tecnologia e o conhecimento necessários?
Sem dúvidas. Em relação à tecnologia, o intervalo de tempo entre o lançamento de um equipamento no exterior e sua chegada aqui tem se reduzido. Contamos com a grande maioria das ferramentas tecnológicas que efetivamente auxiliam no tratamento de doenças. O grande problema é o custo ao chegarem aqui, não disponível para todos, infelizmente.

Que país é líder na área?
Do ponto de vista de disponibilidade de recursos tecnológicos e de grandes instituições dedicadas à neurocirurgia, os Estados Unidos.

Não satisfeito, além de neurocirurgião e membro da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia, você tem dois MBA executivos?
Isso mesmo! Tenho um MBA executivo em gestão de saúde pelo Hospital Albert Einstein e um outro MBA de finanças. Além da medicina, compartilho grande interesse pelos processos de gestão e pela forma como a economia e o mercado financeiro funcionam. Senti a necessidade de também me profissionalizar nessas áreas.

Gestão é tão importante como a própria profissão? Uma aliada?
É fundamental. A gestão eficiente e colaborativa é capaz de transformar vidas em uma magnitude muito maior do que um único médico ou grupo de médicos consegue atingir.

No que uma ideal gestão colabora e melhora a vida dos pacientes?
A medicina deve ser pautada nos princípios de qualidade e segurança, sempre. Ter um processo de gestão eficiente ajuda a atingir esses objetivos. Imagine uma troca de medicação? Uma falta de sinalização de alguma alergia? Processos bem instituídos ajudam a reduzir isso, além de trazer uma outra dimensão para o setor da saúde, garantido experiências de atendimento e cuidados que todos merecem.

É uma inovação com o mesmo peso da tecnologia?
Processos bem instituídos, muitas vezes, são mais transformadores que a própria tecnologia. Deve-se sempre iniciar uma gestão de performance escolhendo e treinando adequadamente as pessoas, criando processos e, por fim, se necessário, encontrar as ferramentas tecnológicas que possam fazer a diferença. A tecnologia não é fim, é meio.

Para terminar com chave de platina, como foi realizar, em Minas, a primeira cirurgia de aneurisma cerebral com o paciente acordado?
Procuro sempre estar atento a grandes movimentos de inovações e novas tendências. Já acompanhava um colega neurocirurgião que atua nos Estados Unidos que se aprofundou nessa técnica. A cirurgia com o paciente acordado já é bem estabelecida para os tumores cerebrais, mas ainda muito incipiente para aneurismas. Na ocasião, em parceria com meu colega, Dr. Bernardo Aramuni, estávamos responsáveis pelo tratamento de um paciente que havia apresentado um quadro de AVC (acidente vascular cerebral) e possuía uma sequela, não movimentava metade do corpo.

Final feliz?
Durante a investigação, foi encontrado um aneurisma cerebral situado em uma região do cérebro que era responsável pelo controle da movimentação do lado do corpo funcionante desse paciente. Por isso, qualquer chance de déficit motor seria catastrófica para ele. A cirurgia com o paciente acordado era a modalidade que traria mais segurança, garantindo, em tempo real, que, após a clipagem do aneurisma, ele continuaria bem. E foi isso que aconteceu. O resultado foi espetacular e, depois disso, já realizamos vários outros casos bem-sucedidos.

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